terça-feira, 13 de maio de 2014

13 DE MAIO – ABOLIÇÃO DA ESCRAVATURA?


Neste, 13 de maio, data da Lei Áurea, legislação que marca do fim da escravidão dos negros no Brasil, a Secretaria de Equidade da FEMERGS reuniu informações para a reflexão sobre o tema da escravidão, como teve início em nosso país, e que continua, nos dias de hoje, permeada, sempre, pela realidade das desigualdades sociais e da lógica do poder econômico acima dos direitos humanos.

Escravidão dos negros no Brasil
Em uma breve reflexão sobre o período da escravidão dos negros no Brasil, que começou com a colonização do país, pelos portugueses, e permaneceu por mais de 300 anos, percebemos que a motivação da prática desumana de exploração do trabalho era econômica e continua nos dias de hoje.
No início da colonização, não existia mão-de-obra para a realização de trabalhos manuais. Diante disso, eles procuraram usar o trabalho dos índios nas lavouras; entretanto, esta escravidão não pôde ser levada adiante, pois os religiosos se colocaram em defesa dos índios, condenando sua escravidão. Assim, os portugueses passaram a fazer o mesmo que os demais europeus daquela época. Eles foram à busca de negros, na África, para submetê-los ao trabalho escravo em sua colônia. Deu-se, assim, a entrada dos escravos no Brasil.
A economia do país contava somente com o trabalho escravo para realizar as tarefas da roça e outras tão pesadas quanto estas. As providências para a libertação dos escravos deveriam ser tomadas lentamente.
A partir de 1870, a região Sul do Brasil passou a empregar assalariados brasileiros e imigrantes estrangeiros; no Norte, as usinas substituíram os primitivos engenhos, fato que permitiu a utilização de um número menor de escravos. Já nas principais cidades, era grande o desejo do surgimento de indústrias. Visando não causar prejuízo aos proprietários, o governo, pressionado pela Inglaterra, foi alcançando seus objetivos aos poucos. O primeiro passo foi dado em 1850, com a extinção do tráfico negreiro. Vinte anos mais tarde, foi declarada a Lei do Ventre-Livre (de 28 de setembro de 1871). Esta lei tornava livre os filhos de escravos que nascessem a partir de sua promulgação.
Em 1885, foi aprovada a lei Saraiva-Cotegipe ou dos Sexagenários, que beneficiava os negros com mais de 65 anos. Foi em 13 de maio de 1888, através da Lei Áurea, que a liberdade total finalmente foi alcançada pelos negros no Brasil. Esta lei, assinada pela Princesa Isabel, abolia de vez a escravidão no Brasil.


A vida dos negros brasileiros após a abolição
Após a abolição, a vida dos negros brasileiros continuou muito difícil. O estado brasileiro não se preocupou em oferecer condições para que os ex-escravos pudessem ser integrados no mercado de trabalho formal e assalariado. Muitos setores da elite brasileira continuaram com o preconceito. Prova disso, foi a preferência pela mão-de-obra europeia, que aumentou muito no Brasil após a abolição. Portanto, a maioria dos negros encontrou grandes dificuldades para conseguir empregos e manter uma vida com o mínimo de condições necessárias (moradia e educação principalmente).

A escravidão contemporânea
A escravidão contemporânea é diferente daquela que existia até o final do século 19, quando o Estado garantia que comprar, vender e usar gente era uma atividade legal. Mas é tão perversa quanto, por roubar do ser humano sua liberdade e dignidade. E ela não se resume à terra de ninguém, que é a região de expansão agrícola amazônica, mas está presente nas carvoarias do cerrado, nos laranjais e canaviais do interior paulista, em fazendas de frutas e algodão do Nordeste, nas pequenas tecelagens do Brás e Bom Retiro, da cidade de São Paulo.
A nova escravidão é mais vantajosa para os empresários que a da época do Brasil-Colônia e do Império, pelo menos do ponto de vista financeiro e operacional. Antigamente, a propriedade legal era permitida, hoje não. Mas era muito mais caro comprar e manter um escravo do que hoje. O negro africano era um investimento dispendioso que poucas pessoas podiam ter. Hoje, o custo é quase zero - paga-se apenas o transporte e, no máximo, a dívida que o sujeito tinha em algum comércio ou hotel. Além do fato de que, se o trabalhador fica doente, é só largá-lo na estrada mais próxima e aliciar outra pessoa. O desemprego é gigantesco no país, e a mão-de-obra, farta.
O Brasil contabiliza 46.478 trabalhadores libertados em condições análogas à de escravos desde 1995, ano em que os grupos móveis de fiscalização passaram a atuar no país. O trabalho das equipes, compostas de auditores fiscais, procuradores do Trabalho e policiais federais ou rodoviários federais, completa 20 anos em 2014.
Só no ano passado, quando foram comemorados os 125 anos da Lei Áurea, 2.063 pessoas foram resgatadas, de acordo com números do Ministério do Trabalho e Emprego, o que representa uma média de mais de cinco pessoas por dia. O número de operações em 2013 foi recorde: 177.
Na escravidão contemporânea, não faz diferença se a pessoa é negra, amarela ou branca. Os escravos são miseráveis, independentemente de raça. Porém, tanto na escravidão imperial quanto na do Brasil de hoje, mantém-se a ordem por meio de ameaças, terror psicológico, coerção física, punições e assassinatos. Ossadas têm sido encontradas em propriedades durante ações de fiscalização, como na fazenda de Gilberto Andrade, família influente da região Sul do Pará.
Não há estatística exata para o número de trabalhadores em situação de escravidão no país. Estima-se que sejam entre 25 mil e 40 mil, de acordo com número da Comissão Pastoral da Terra (CPT) – órgão, ligado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, e a mais importante entidade não-governamental que atua nessa área – e da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
A forma de trabalho forçado mais encontrada no país é a da servidão, ou “peonagem”, por dívida. Nela, a pessoa empenha sua própria capacidade de trabalho ou a de pessoas sob sua responsabilidade (esposa, filhos, pais) para saldar uma conta. E isso acontece sem que o valor do serviço executado seja aplicado no abatimento da conta de forma razoável ou que a duração e a natureza do serviço estejam claramente definidas.
As primeiras denúncias de formas contemporâneas de escravidão no Brasil foram feitas em 1971 por dom Pedro Casaldáliga, na Amazônia. Sete anos depois, a CPT denunciou a fazenda Vale do Rio Cristalino, pertencente à montadora de veículos Volkswagen e localizada no sul do Pará. O depoimento dos peões que conseguiram fugir a pé da propriedade deu visibilidade internacional ao problema.
Outro exemplo de envolvimento de grandes empresas é o das fazendas reunidas Taina Recan, em Santa do Araguaia, e Alto Rio Capim, em Paragominas, ambas no Pará, pertencentes ao grupo Bradesco, onde, entre as décadas de 70 e 80, foram encontrados trabalhadores reduzidos à condição de escravidão. O governo acaba envolvido indiretamente com o trabalho forçado quando financia empresas que se utilizam da prática.
Apesar de as convenções internacionais de 1926 e a de 1956, que proibiam a servidão por dívida, entrarem em vigor no Brasil em janeiro de 1966, o país demorou para criar um mecanismo para combatê-la. O que veio a acontecer apenas em 1995, quando foram instituídos os grupos móveis de fiscalização.
O Plano Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo, lançado no início de 2003, reúne 76 medidas de combate à prática. Entre elas, projetos de lei como o que expropria terras em que for encontrado trabalho escravo e transfere para a esfera federal os crimes contra os direitos humanos, limitando assim as influências locais nos processos. A implantação do plano tem sido lenta e muitas vezes esbarra na falta de verbas, pressão da bancada ruralista e na incapacidade do governo federal de liberar recursos para aumentar e aparelhar a fiscalização.
Mudanças na legislação tornaram mais duras as penas para quem for pego com trabalho escravo. Mas, mesmo com fiscalização, multas, prisão dos envolvidos, cortes em linhas de crédito não se consegue atacar as consequências, deixando muitas vezes a causa em aberto. O trabalhador resgatado não vê opções para a sobrevivência e acaba caindo de novo na armadilha. “Com terra para plantar não teria ido embora [da minha terra]. Além disso, pessoa bem estudada não precisa sair, arruma emprego. Os outros têm de ir para o machado mesmo”, afirma um trabalhador libertado. Escravidão no Brasil é sintoma de algo maior: desigualdade.

Ranking do trabalho escravo
O estado de Minas Gerais lidera o ranking tanto de libertações como de trabalhadores aliciados, com o registro de 2 mil pessoas resgatadas nos últimos cinco anos. Logo atrás está o Pará, com 1.808. Goiás, com 1.315, São Paulo, com 916, e Tocantins, com 913, compõem o grupo dos cinco mais.
Minas também é o principal estado de origem dos trabalhadores libertados. De acordo com o levantamento do Ministério do Trabalho, 1.643 trabalhadores foram aliciados pelos chamados “gatos” (os intermediadores da mão-de-obra) no estado do Sudeste. O Maranhão aparece logo atrás, como terra natal de 1.641 pessoas resgatadas. Pará, com 1.395, Bahia, com 1.325, e Goiás, com 775, são os outros estados onde mais trabalhadores são arregimentados.


PEC do trabalho escravo
A proposta de emenda à Constituição altera o artigo 243, determinando que as propriedades rurais e urbanas de qualquer região do país onde for flagrada a exploração de trabalho escravo sejam expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei. Além disso, prevê que todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência dessa exploração seja confiscado e revertido a fundo especial.

Lista suja
Outro importante instrumento de combate ao trabalho escravo completa 10 anos: a chamada “lista suja”. O cadastro de empregadores flagrados submetendo trabalhadores a condições análogas à de escravos é considerado uma das principais ferramentas para coibir a prática hoje no país. Quando um nome é incluído nele, instituições suspendem financiamentos e o acesso a crédito. Empresas signatárias do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo também aplicam bloqueios e restrições comerciais.


Trabalho escravo infantil
O trabalho infantil no Brasil ainda é um grande problema social. Milhares de crianças ainda deixam de ir à escola e ter seus direitos preservados, e trabalham desde a mais tenra idade na lavoura, campo, fábrica ou casas de família, em regime de exploração, quase de escravidão, já que muitos deles não chegam a receber remuneração alguma. Em torno de 4,8 milhões de crianças de adolescentes entre 5 e 17 anos estão trabalhando no Brasil, segundo PNAD 2007. Desse total, 1,2 milhão estão na faixa entre 5 e 13 anos.
Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio, do IBGE, sobre o panorama brasileiro, informam que o trabalho infantil doméstico, exercido na casa de terceiros, atingia 258 mil brasileiros de 10 a 17 anos, em 2011. 94% das crianças e adolescentes no trabalho doméstico são do sexo feminino.
As falhas nas políticas de educação no campo e em zonas florestais atingem principalmente a população indígena, ribeirinha e extrativista. Na área urbana, crianças e adolescentes em situação de miséria e baixa renda vendem doce no farol, atuam no tráfico de drogas ou trabalham em lixões, por exemplo.

Nenhum comentário: